terça-feira, 13 de julho de 2021

Carta para Falero

Falero, escrevo esta carta para dizer que li seu livro e também para pedir desculpas. Eu deveria estar presente no encontro on line do Clube do Livro de Canela, em junho, mas a exaustão me derrubou e eu acabei dormindo antes do encontro. Acordei de madrugada muito triste pensando no que perdi. Eu li o teu livro e confesso que "Os Supridores" (editado pela Todavia) não foi um choque de realidade, porque aquelas histórias eu já tinha visualizado (ou conhecido) através de amigos. Teu livro foi um sopro de compaixão no meu momento. Tive a possibilidade de me familiarizar com as imperfeições do Pedro, do Marques e do Luan. E através deles enxerguei as minhas imperfeições. Como eles questionaram o merecimento da humilhação, da manipulação e do ciclo da pobreza, também me perguntei onde eu me situava neste cenário e como poderia me deslocar neste jogo, para ser mais colaborativa e menos reativa. Teu livro me mostrou que realmente estamos fartos de nos ofender, mas que ainda não sabemos navegar pela alma dos outros. Ainda somos egoístas, não sabemos vibrar com a conquista alheia, com a vitória do outro que não seja eu. Como teus personagens não quero mais um trabalho que só me faça anestesiar. Quero um trabalho que me faça produzir, criar, mas principalmente, que me faça sonhar e realizar.
Somos merecedores dos nossos padrões de vida? Até onde? "Merecimento é rosto suado e mão calejada" dizem tuas vozes. Por que insistimos no esforço sobre humano para sermos dignos de algo? Seríamos Hércules ou meros pagões pretenciosos? E nossas crianças que se dividem entre pobres e ricas? Crianças vivem com sonhos, com amarelinha riscada na calçada, com pedrinha que vira carro de corrida. Criança não tem rótulo na testa, nem etiqueta de fabricação. Criança é só criança. E adulto que se limita por causa de discurso ainda mais limitante é só um ser qualquer. Talvez os idiotas sejam mais felizes, e neste ponto tu fechou com Dostoievski, quando escreve "Ele disse que preferia ser um idiota, porque daí ele ia ser um cara feliz, porque ia ficar satisfeito com a vida fodida que ele tem." É Falero! Estou querendo ser a idiota que não arrotou certezas, mas que ousou ser solidária, e por isto mesmo se fudeu muito. Sincera gratidão é o que te digo caro escritor, por me lembrar de histórias anônimas que me fizeram mais humana, que me transformaram em gente quase de verdade. Porque "o de verdade" talvez não exista. O que existe é algo chamado "o que é possível". Parece que a vida nunca vai nos permitir "o de verdade", mas sempre vai permitir a superação e a possibilidade. Obrigada pela metáfora da sopa, e por me mostrar que a medida entre o sal e a água faz o sabor. Muitas vezes salguei a sopa e errei na reposição da água. Porém sempre tomei a sopa, qual fosse o gosto, porque viver ainda é o mais importante. Obrigada Falero.

Por que me tornei uma colagista

Em 2001 fiz um auto exílio na Suíça, em função de um casamento. Jornalista no Brasil, lá me descobri uma analfabeta. Além de precisar apre...