quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Morreste-me


Eu estava fotografando as roupas do brechó da Boutique e tive uma ideia: reunir moda sustentável e literatura. Assim uma saia branca, uma blusa listrada e um livro de prosa poética do escritor português José Luís Peixoto chegaram nesta foto. Uma imagem romântica, suave que combina com finais de tarde silenciosos, como o de hoje, quarta feira dos primeiros dias de janeiro de 2018.


Peguei o livro de 62 páginas e que revelou o escritor português em 2.000. Pequeno, delicado. Sentei às 19h20min no sofá. Romeu, o gato gordo sentou no meu colo. Quando ele se ajeitou, do nada, uma libélula pousou no meu joelho. Ficamos os dois observando aquele ser alado. O personagem daquelas linhas de prosa poética já mostrava seus primeiros sentimentos. Silêncios, olhares. Ritmo e música num português que responde não à razão, mas ao coração.

"E pensei não poderiam os homens morrer como morrem os dias?" (pg. 17) Os parágrafos se desenrolam como numa carta de despedida e recomeço. Um fim de ciclo e o início de uma vida que já estava se construindo em lembranças e memórias vividas. Um pai e um filho. Uma mãe e uma irmã. Vidas unidas num luto, se despedindo de uma outra vida que se viu morrer.

A leitura do livro vale em qualquer momento, mas lê-lo num final de tarde é ajustar os ponteiros com a poesia que nele há. Somos transportados não para um outro mundo, mas para um sentimento de amor que todos temos conosco. Porque perder não é somente tristeza. Perder é dar continuidade do alheio na sua própria vida. Sempre. Não terminamos. Continuamos o outro em cada detalhe dele confirmado em nós.

José Luís Peixoto é humanidade em linhas, é humanidade na veia. Como voltar a viver sem ler sua obra? Deixar de ler Peixoto é voltar para a escuridão de uma perda sem reconhecimentos. 20h50min e estava escuro, mas não queria acender a luz antes de ler as duas últimas páginas. Leia e releia. Qualquer página. Se perca naquelas linhas, mas principalmente na página 45: "É luz o tempo, pai".

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