A leitura de Desonra, (Cia das Letras) de J.M. Coetzee, foi um soco no
estômago, que não gerou dores, mas alívio. Viver neste mundo não está sendo
fácil e para nos consolarmos buscamos táticas imediatas e imaginárias. Nos
refugiamos em mundos lindinhos, cheios de frufrus, para esquecermos a vida e
sua cara. Este livro foi vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 2003.
Coetzee nos traz a uma
vida que é para todos, independente do país que moramos. Lucy e David nos
mostram que idealismo e realismo são somente convenções. E precisamos escolher
nossas próprias convenções para continuarmos vivendo. Não existe o certo ou o errado.
Existe o jeito de conseguir viver. Para alguns é trabalhando pela justiça. Para
outros é se atendo à superficialidade.
Podemos insistir ou
desistir da vida. Podemos sim. E não cabe a ninguém julgar. Cada qual com sua
interpretação. Mais marcante que o estupro narrado, para mim, foi o massacre dos cães.
Talvez porque matar seres inocentes me choca mais do que machucar seres que
possuem livre arbítrio. A leitura de “Desonra” me fez rever minhas crenças
espirituais. Sou simpatizante do espiritismo. Acho que tudo é conseqüência de um ato. Muitas vezes
sofremos por atos de nossos antepassados, em função de um contrato espiritual
firmado entre as pessoas que encarnam como familiares. Lucy e David, além de
outros personagens, pagam o preço da conquista forçada, da entrada sem bater na
porta. A África é um campo minado. Sentimentos de revolta e de ódio são
constantes num povo que foi violado, explorado, maltratado. O que esperar para
personagens brancos, detentores de posses? O pior. Talvez por isto não me
comovi. Mas com a morte dos cachorros fiquei mexida.
No entanto, a questão da
“eutanásia” realizada por Bev Shaw, com a cumplicidade de David, não me comove
e muito menos me entristece. Trabalho como voluntária numa ONG da causa animal
e quando os problemas beiram o limite da lucidez me vejo desejando sessões de
eutanásia semanais.
Coetzze mexeu comigo.
Mostrou-me que não somos bons ou ruins, mas que fazemos escolhas. Apenas isto.
De acordo com o que já vivemos. De acordo com o que mostraram para nós. Como é
possível se libertar? Ainda não sei.
Título original: Disgrace
Autor: John Maxwell Coetzee
Tradução: José Rubens Siqueira
Gênero: Romance
Páginas: 248
Editora: Companhia das Letras
Publicação: 1999
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