terça-feira, 9 de março de 2021

A retomada Xocleng, em São Chico


O Brasil perdeu sua identidade antes mesmo de se reconhecer como uma terra distinta. Era território de índios, de soberanias indígenas. Se perdeu na chegada de colonizadores brancos, que eram dominadores. Abusou quando fez outros povos como escravos, os índios e os negros. Ignorou princípios básicos da vida. Diferenciou por cor. Não reparou que a natureza se faz de muitas cores.



Sábado passado, o Bolívar Medeiros, recebeu na Rádio Web São Chico,o cacique Woie, da tribo Xocleng. Para quem acha que índio é somente assunto de aula de história ou desenho a pintar no dia 19 de abril, saiba que a tribo Xocleng vive no Brasil há muito mais de cem anos. Foi perdendo seu território nas demarcações realizadas pelos governos brasileiros, que nunca se mostraram muito interessados em preservar a diversidade das etnias brasileiras.

Na época dos bugreiros/bandeirantes/caçadores de índios, estes, recebiam dinheiro por par de orelhas nativas entregues ao governo da época. O povo que perdeu terra, direito a caçar, pescar, plantar,  e que quase perdeu a dignidade, se diz sobrevivente e como tais ouviram o chamado dos ancestrais. Os povos indígenas estão requerendo judicialmente as florestas nacionais como suas terras. Florestas estas que estão para entrar em processo de privatização. Em outras palavras: na privatização, uns poucos utilizam o lugar, que seria de Todos se Todos conhecessem seus direitos, para ganhar dinheiro explorando o local. Os Xocleng reinvindicam a terra para preservar a natureza. A briga entre o público e o privado aproveitando o desconhecimento que o povo tem sobre o quê é seu por direito. Vivemos numa época onde reverenciar político é mais interessante do que estudar e conhecer seus direitos e deveres. Somos um povo formado por ignorantes orgulhosos de sua ignorância.

Já são dez anos de luta na justiça, pouco diálogo e cerca de trinta e oito pessoas da tribo vivendo no acostamento de estrada da Flona São Francisco de Paula/RS. O cacique Woie, por várias vezes, perguntou: "Por que não querem nos ouvir? Por que nossa presença causa estranheza?"

As pesquisas históricas confirmam a presença dos indíos no território de São Francisco de Paula. O historiador José Carlos Santos da Fonseca esteve no programa lendo trechos de suas pesquisas, publicadas em livros. O assunto está agendado na Assembléia Legislativa do Estado, ganhou mídia estadual e nacional, repercussão nas redes sociais, mas mesmo assim as trinta e oito pessoas (incluindo 14 crianças entre 0 e 13 anos) estão desassistidas, vivendo das doações de pessoas e poucas entidades que se sensibilizam com a causa. Tudo isto em plena pandemia do Covid 19. 

As perguntas levantadas pelos ouvintes, durante as quase duas de programa, foram muitas. "Por que as demarcações de terras indígenas pararam?" Já são trinta anos sem demarcações. "Por que a cultura de um povo com quase quatro mil anos de existência não é reconhecida?" Existem relatos datados de 1840 de um padre sobre sua convivência com os Xocleng. Existem comprovações da existência de suas casas subterrâneas. Eles querem contar sua história, querem conversar. Querem preservar a natureza, que insistimos em destruir com agrotóxicos, falta de saneamento, ausência de diálogo e muita importância para a diferença de cores de pele. "Só existe um povo neste planeta, o ser humano", disse o cacique.

"Nossa bandeira é a humanidade!" E esta fala é da jornalista aqui que defende a existência da diversidade para a garantia da vida. Sejamos muitas cores, muitas vozes e idiomas. O plural é a soma de singularidades. Nas muitas culturas e religiões que se respeitam e se ajudam. Nos estilos de vida tão diversos que se complementam. Nos abraços, que já não nos são permitidos, mas que voltarão, quando entendermos que precisamos estar mais juntos e unidos pela vida de todos.

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